quarta-feira, janeiro 04, 2006

Marks & Spencer

Seis uanabi-designers batendo perna uma semana em London London, não precisou completar o primeiro dia pra gente esbarrar na maior catedral das artes gráficas da cidade. E não estou falando da Tate Modern, esse incrível projeto arquitetônico que converteu recentemente um galpão de fábrica em museu, exibindo toda a esquizofrenia e sensacionalismo que chamam por aí de arte conteporânea. E nem tampouco do Design Museum, com sua fila traçando a história das cadeiras do século vinte (em tudo que isso tem de ridículo) e as cinco libras que cobram na entrada (achou pouco, multiplica por quatro e meio). Porque design é produto muito efêmero pra se pendurar em parede de museu, os melhores você acha na rua, no cardápio do restaurante, no programa do teatro, na prateleira do supermercado. Principalmente se for um supermercado da rede Marks & Spencer.

O Marks & Spencer é um supermercado diferente. Não tem sucrilhos Kellogs, nem presunto Sadia, nem arroz Tio João. Tem sucrilhos, presunto e arroz, como cabe a qualquer supermercado, mas todos de marca própria. Não há um só produto da rede que não leve o selo Marks & Spencer, o mundo ideal para qualquer programador visual, que pode projetar a identidade da empresa desde o letreiro na porta até a tabela de nutrientes na embalagem de lasanha congelada. O resultado é um ambiente coerente, onde a sinalização interna combina com a ração de cachorro, o uniforme do caixa casa com o sabão em pó, tudo faz parte da mesma linguagem gráfica, em vez do carnaval que é um supermercado comum, com cada produto tentando chamar a atenção pra si. E o melhor é que eles levaram o projeto todo com a maior sobriedade, sem embalagens com splashs de colecione as tampas de margarina, de responda qual é o melhor e ganhe um carro, de ajude o nescauzinho júnior a achar nas palavras cruzadas o nome de todas as vitaminas que o papai toddy possui.

É claro que tudo isso não adianta de nada. Nós seis, quer público-alvo mais evidente que esse, depois de uma hora admirando o brilhantismo da coisa, a forma como foi feita o sistema de hierarquias dos produtos, em que os tipos de leite têm uma organização visual subordinada ao grupo maior dos laticínios, que por sua vez são parte de um conjunto maior de matinais e assim por diante, saímos sem comprar nada. Tava caro. Melhor ir na filial do Guanabara e comprar uns sanduíches de pão de forma por uma libra e prevenir a inanição sem doer no bolso. O Marks & Spencer, aliás, está à beira da fal⁄ência. O valor de suas ações na bolsa caiu em dois terços, não possui mais do que um quarto do número de lojas do agora primeiro colocado no segmento. Isso porque a companhia insistiu em aumentar descomunalmente sua margem de lucros, e porque quis manter os fornecedores britânicos enquanto os competidores buscavam países mais em conta de onde importar seus produtos, e porque sua história centenária não tem mais apelo aos consumidores jovens. Todos assuntos muito mais importantes, que não tem nada a ver com design gráfico, mas que ressaltam que o que vende mesmo é preço e marketing. Design mesmo, só serve pra eu (tentar) ganhar dinheiro fazendo o que gosto.

4 Comments:

At 2:53 PM, janeiro 05, 2006, Anonymous Anônimo said...

Que história triste...
Como o mundo é injusto. Porque as pessoas não podem ganhar produtos legais assim de graça? ;)
Bjo.
 

At 10:48 PM, janeiro 05, 2006, Blogger Mauro said...

Espero que pelo menos pra isso sirva! Já viu as taças de champagne que não ficam em pé (têm que ser colocadas em um suporte ou num baldinho de gelo)? É a coisa mais ridícula e inútil desde a invenção do orkut.
 

At 11:24 PM, janeiro 06, 2006, Blogger Rodrigo Rego said...

po, perai! eu posso sacanear a minha profissao, mas só eu!

deve tar cheio de engenheiro fazendo pontes caindo e nem por isso as pessoas consideram engenharia inutil
 

At 3:30 AM, janeiro 07, 2006, Anonymous Anônimo said...

ele não falou da sua profissão.

mas já que a carapuça serviu ... =P

Fica assim não, ainda tem salvação =]
 

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Profile

Rodrigo Rego

Sou designer, fascinado por bandeiras, jogos de tabuleiro, países distantes, e uma miscelânea de assuntos destilados quase semanalmente neste espaço.

Visite meu site, batizado em votação feita aqui mesmo, Hungry Mind.

rodrego(arroba)gmail.com
+55 21 91102610
Rio de Janeiro

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