domingo, agosto 16, 2009

Tuitadas de Nova York

Não uso Twitter, não vou permitir que outra ferramenta reforce o poder de procrastinação da internet. Um dia acabo me rendendo, mas até lá isso sigo apreciando a vista daqui do alto do último bastião em pé diante da enxurrada tecnológica. E disfarçadamente, tuitando no blog:

Nova York me convenceu de que dez milhões de pessoas acumuladas podem se transformar numa metrópole viável e até com várias vantagens sobre as cidades vinícolas francesas ou as vilas alpinas onde eu almejava morar.

Placar Starbucks: Camila 4x0 Rodrigo

O melhor momento de uma peça é o agradecimento final. Vem os extras, os coadjuvantes e por fim os protagonistas, se enfileiram, fazem a reverência e por fim dão as mãos sinceramente emocionados. Me sinto um cúmplice exclusivo dessa felicidade, uma testemunha do único momento autêntico do teatro, depois de duas horas de diálogo decoreba repetido diariamente pra quem quiser pagar.

Placar de Starbucks: Camila 8x0 Rodrigo

Não lembro da última vez que topei com algum conhecido andando no Rio. Mas esbarrei em plena Times Square com dois amigos. Já é a terceira vez que me acontece no exterior. Provavelmente porque aqui ficamos todos da casa pro trabalho e vice-versa, e lá circulamos na rua o dia inteiro. Se as pessoas caminhassem a esmo pela cidade metade de quando estão turistando, velhas amizades se encontrariam todos os dias. E claro, a rua seria um inferno.

Placar de Starbucks: Camila 10x1 Rodrigo

Meu pai disse que em Manhattan existem 250 Starbucks. Objetivo: achar todos.

Placar de Starbucks: Camila 12x4 Rodrigo

Achamos uma loja de bandeiras num shopping no pier. Alguns anos atrás eu entraria em estado de graça, compraria todas que pudesse. Mas depois da internet já não dá pra se encarar uma loja dessas como a oportunidade da sua vida de arranjar a bandeira do Turcomenistão. Um clique no flagsoftheworld.com e pronto, colecionar qualquer coisa perdeu a graça.


Placar Starbucks: Camila 15x9 Rodrigo

Comprei uma camisa do Obama e um binóculo. Alcance de 18 Km.

Placar Starbucks: Camila 17x11 Rodrigo

Fiquei um pouco frustrado com o Central Park. Muito paisagístico e tal, mas assim como o Harlem, nenhum Starbucks.

Placar Starbucks: Camila 18x11 Rodrigo

Meus novos heróis da música pop para a próxima semana, ouvidos de graça e de joelhos, num concerto na Union Square:



Placar Starbucks: Camila 21x12 Rodrigo

Estou sentindo que essa contagem de Starbucks está começando a atrapalhar a viagem. Estamos prestando mais atenção em letreiros verdes que no resto da cidade, e ainda faltam mais de 200.
Placar Starbucks: Camila 22x14 Rodrigo

Fomos num restaurante etíope. A comida não tem nada demais, a diferença é a forma de servi-la. Não tem garçom. Você pede e ela chega num para-quedas, dentro de um engradado da ONU.



Placar Starbucks: Camila 23x16 Rodrigo

A viagem já está na metade. Se quisermos mesmo completar todos os Starbucks, vai ser preciso jogar em equipe. Camila é mais atenta, vê alguém com canudinho verde e já sabe que tem um nas redondezas. Já eu sou bem menos míope. Juntando o faro dela com meus olhos de lince, somos uma máquina detectora de Starbucks.

Contagem de Starbucks (juntando nossos escores): 52 de 250 — vejam a melhora, 13 num dia só

Percorremos a 1a e a 2a avenidas de ponta a ponta, costa grudada com costa, para ter uma visão de 360. 22 Starbucks encontrados. Amanhã é dia da 3a e 4a.

Contagem de Starbucks: 74 de 250

Comprei outro binóculo. Mais tarde explico.

Contagem de Starbucks: 107 de 250

Há Starbucks nos lugares mais inusitados. Um no segundo andar do saguão do Empire State, outro na estação de metrô de Battery Park, um terceiro exposto no MoMA, servindo sopa Campbell. Estamos entrando em cada loja, cada buraco, desencavando todos.

Contagem de Starbucks: 140 de 250

Fui na Macy's, e além de achar mais três Starbucks, comprei terno, Rayban e pasta preta. Disfarçado de executivo, procuro Starbucks nos lugares restritos a turistas. O golpe é sempre o mesmo. Passo o RioCard na catraca eletrônica da portaria (todo prédio em Manhattan tem uma), e quando o acesso é negado, culpo a máquina e peço ajuda pro segurança, porque afinal estou atrasado. Foram 46 Starbucks dentro de prédios empresariais, bolsas de valores, tribunais e juntas comerciais.

Contagem de Starbucks: 189 de 250

Por que estou fazendo isso? Eu nem gosto de café.

Contagem de Starbucks: 203 de 250

Hoje fiquei no hotel, na internet. Estou divisando um plano de emergência. Minha irmã foi à caça sozinha, e sem minha ajuda, achou apenas 10 Starbucks.

Contagem de Starbucks: 213 de 250

Tem um estande do Starbucks na catedral de St. Patrick, atrás do altar. É verdade, pode checar na Wikipedia.

Contagem de Starbucks: 228 de 250

Ainda 22 Starbucks faltando e hoje temos que pegar o avião. No aeroporto (mais 2 Starbucks, mas não conta, por que é fora de Manhattan), o comissário diz que nosso vôo teve overbooking. Quer fazer embarcar ou prefere um reembolso de 400 dólares para adiar um dia a data do vôo? Claaaro que preferimos.

Contagem de Starbucks: 239 de 250

Dessa vez não teve overbooking, e ainda faltam 11 Starbucks. Hora de botar o plano em ação, aquele elaborado no dia em que fiquei no hotel usando a internet. Imprimi duas cópias do Googlemaps indicando a localização de cada Starbucks de Manhattan. Além disso, 2 binóculos de longo alcance a postos nos assentos 46A e 46G, em janelas opostas bem atrás da asa. O avião inclina pra cá, eu vejo os 5 Starbucks restantes em Uptown. Inclina pra lá, e Camila vê os 5 de Downtown. Procuro desesperado o último Starbucks de Midtown. Ele está bem embaixo do avião não há ângulo.


Na minha cabeça, vêm as terríveis imagens daquela vez que quase zerei o Tartarugas Ninja do fliperama. O Destruidor já piscando de tanta bastonada (joguei com o Donatello) e eu procurando a última ficha na pochete. O Continue esgotando, 4, 3, 2. No 1 eu coloco a ficha na máquina, ela demora a cair, o contador chega ao zero e o jogo recomeça na primeira fase.

Surge a idéia. O avião já cruzando o Hudson, e eu começo a mirar o binóculo nos prédios espelhados abaixo do Central Park. Foco no 42o andar da Trump Tower. Uma das janelas está inclinada pra baixo, no ângulo ideal. Lá está ele: 34a com 6a, apenas um reflexo do S salvador, não sei se de Star ou de buckS, entre o McDonalds e a caixa de ar-condicionado ao lado que não me deixa ver a continuação da rua. A letra, verde em relevo sobre uma placa preta, é inconfundível. De relance, vejo um mestrando de Ciências Políticas, fechando um Mac enquanto sai da loja com o copinho de canudinho verde. Não há mais dúvidas.

Profile

Rodrigo Rego

Sou designer, fascinado por bandeiras, jogos de tabuleiro, países distantes, e uma miscelânea de assuntos destilados quase semanalmente neste espaço.

Visite meu site, batizado em votação feita aqui mesmo, Hungry Mind.

rodrego(arroba)gmail.com
+55 21 91102610
Rio de Janeiro

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