segunda-feira, abril 28, 2008

O fim do caderninho de anotações

Eu ia fazer um post sobre uma coincidência: a minha saída do trabalho (sim, desde sexta passada sou freelancer, que é uma maneira otimista de encarar o desemprego) e o fim do meu caderninho de anotações.

O último post foi escrito driblando o colofon do caderninho.

Meu caderninho, pra quem são sabe, é um improviso que deveria servir como agenda, mas só é usado para escrever posts garranchados no pula-pula do ônibus entre casa e trabalho. Cheguei à última página dele no post anterior, que triste. Eu ia escrever sobre como o fim das anotações sacolejadas simbolizava o término de uma rotina sem sentido e sem freio que eu não almejo para a minha vida.

Eu ia. Mas aí sentei em frente à tela calma e confortável do meu Mac e deu branco. Não saiu uma palavra.

Acabei escrevendo este post sacolejando no 464 até o centro da cidade, em outro caderninho. O que quer que isso simbolize, eu não quero saber.


Este é o primeiro post com links explícitos de navegação interna, esses aí de cima. A idéia é aumentar a permanência de vocês no site fornecendo sugestões de leitura relevantes. Blablabla, tem gente ficando desconfiada. me processem.

quarta-feira, abril 16, 2008

Conspiração Larousse II – palavrões de alto calão

Quem viu a reportagem de ontem? Eu vi e detestei. O Lichote deu um tom pesado, carregado no moralismo. Imposição da Globo? Ou ele simplesmente encaretou? Está tratando a disseminação de palavrões em destaque nos dicionários como calamidade.

Lichote foi até a casa de Elton, o gênio do mal por trás da manipulação dos verbetes do Larousse. Sim, ele é nerd, e não, não usa óculos, embora seus olhos pequenos e vermelhos dêem a impresão de precisar. Ele é filmado o tempo todo com uma câmera granulada, balançando como se estivesse oculta, mas era evidente que não estava. Pura estratégia pra dar à matéria um ar de denúncia.

A câmera passeia tremida pelo quarto e sala onde o revisor mora, mostrando as paredes forradas com desenhos de pênis e estantes cheias de miniaturas da Marvel fazendo o Kama Sutra. E aí de repente desvia para focar na gengiva prognata de Elton que diz:

– Quando as crianças vêem animações de bonequinhos nos cantos de página dos dicionários, elas estão aprendendo subliminarmente toda uma casta muito rica do nosso vocabulário que é omitida pelas mães e pelas escolas religiosas. Por isso que eu privilegio os termos chulos mais sofisticados. Chamo eles de palavrões de alto calão. Quero ouvir as crianças falando que acabaram de eructar, e não de arrotar. Quero vê-las falando que estão com a glande intumescida, que seu colega é flatulento, é aí que vejo que meu trabalho tem valor.

Depois um close na gengiva, na risada anasalada, e fim da reportagem. Hoje o caso repercutiu no jornal Meia Hora, com o título “Revisor de dicionários quer ver bilau de criancinhas”. Amanhã esse cara no mínimo vai preso.

E enquanto isso as crianças curiosas que assistiram à matéria já estão subindo estantes atrás do Aurélio do papai. Os palavrões de alto calão vão rapidamente ganhar as escolas. E o Elton, escavando pênis a garfadas nos tijolos de sua solitária pedófila, vai rir por último seu riso anasalado.

segunda-feira, abril 14, 2008

Conspiração Larousse

Se um dia vocês resolverem aceitar ums sugestão deste blogueiro, recomendo atenção especial à dica de hoje. Vejam no Jornal da Globo de hoje à noite, a matéria feita pelo Rafael Lichote, meu colega de escola. O título é o mesmo que inventamos nas aulas de francês do colégio, mais de dez anos atrás: Conspiração Larousse.

Larousse era o nome do nosso dicionário português-francês, excelente para animar bonecos de palitinho naquelas mais de mil páginas finas e maleáveis. Os outros alunos, nosso público, viam só as seqüências dramáticas de bonequinhos sendo engolidos por um tubarão ou lutando caratê com golpes de Street Fighter, mas só eu e o Lichote, que desenhávamos cada frame, sabíamos da verdade: pelo menos 10% dos verbetes em destaque eram palavrões, aqueles no topo e no fim da página que servem para orientar a busca do leitor.

Eram ofensas, partes escondidadas do corpo, profissões malvistas, injúrias, duplos sentidos, safadezas, termos científicos. Não passavam cinco páginas sem aparecer um deles.

Ficamos fascinados, fizemos listas, de “abaitolado” a “ziriguidum”, todas à disposição nas prateleiras mais baixas das bibliotecas primárias. Em outros dicionários era a mesma coisa, mudavam os palavrões mas a incidência era igual. Começamos a ficar intrigados, porque era evidente que o português não tinha tanta imoralidade. Alguém estava deliberadamente colocando os palavrões nas extremidades para lhes dar destaque.


A evidência: um dicionário Michaelis e apenas alguns dos vários palavrões em destaque.

Formulei várias teorias na época para explicar o fenômeno. Disputávamos a autoria da mais disparatada, nos dedicamos tanto ao caso que ficamos os dois em recuperação de francês. Para mim que não tinha nunca nem feito prova final na vida foi um baque, nunca mais voltei ao assunto. Achei que o Lichote tinha aprendido a lição também, mas anteontem me ligou ele no celular:

-Descobri quem escreve os dicionários!

— Os quê?

Os dicionários, cara! Quem bota os palavrões nas pontas das páginas. São os gênios, cara, são pessoas com QI elevadíssimo, acima de 160, eles estão por trás disso tudo.

Sabe esses CDFs que a gente conhece quando é pequeno, ele disse, esse sque tiram 9,7 em álgebra quântica mesmo passando a aula inteira inventando mapas de países da Terra Média? Todo bom colégio como era o nosso tem pelo menos uns dois desses por turma. Onde estão esses caras agora?

— Dirigindo multinacionais.

Um deles está, é verdade, mas ser cabeçudo não te leva automaticamente à presidência da IBM. 50% dos gênios aprendem a esconder seu desprezo pela humanidade burra e conseguem se relacionar em público, mas a outra metade fica cada vez mais sociopata. Desenvolvem comportamentos obsessivos, desenham pênis no caderno, colocam os heróis da Marvel transando com os Cavaleiros do Zodíaco, sei lá;

Ficamos meia hora no telefone, ele me explicando como os párias superdotados precisam arrumar um trabalho que canalise sua sanha enciclopédica e ao mesmo tempo prescinda de qualquer traquejo social. Não lhes falta emprego, a sociedade precisa de muita gente com esse perfil. Aqueles com pendor pra matemática viram hackers, programam software livre. Os que têm gosto pelas línguas podem se tornar, entre outros, revisores de dicionário.

São eles que destrincham página por página todos os verbetes, acrescentando com seu cérebro catalográfico as palavras esquecidas pelos pesquisadores.

— São pervertidos, todos eles, sem exceção.

E se os hackers podem dar vazão às suas frstrações sexuais infestando de vírus as páginas de pornografia, os revisores também podem. Adicionando um adjetivo aqui, subtraindo duas palavras derivadas de lá, enrolando na definição de 2 ou 3 verbetes, eles conseguem empurrar todos os palavrões para os cantos das páginas.

-— As conseqüências são dramáticas.

E não me deu mais detalhes. Acompanhem hoje à noite, no terceiro bloco do Jornal da Globo, a reportagem do Rafael Lichote. O que ele terá revelado sobre a Conspiração Larousse?

Profile

Rodrigo Rego

Sou designer, fascinado por bandeiras, jogos de tabuleiro, países distantes, e uma miscelânea de assuntos destilados quase semanalmente neste espaço.

Visite meu site, batizado em votação feita aqui mesmo, Hungry Mind.

rodrego(arroba)gmail.com
+55 21 91102610
Rio de Janeiro

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