sexta-feira, dezembro 15, 2006

Sistema Solar

Cartões-postais de outros planetas

Plutão

Oi mãe,

chegamos anteontem em Plutão. A viagem dura muito tempo, mas foi confortável. Só não dá pra falar o mesmo desse planetinha em que a gente se meteu, o Beto não podia ter escolhido pior a lua-de-mel. Não tem nada aqui. As cidades ficam dentro de cápsulas térmicas com praias artificiais, e a grande atração é o que os guias chamam de “Kelvin Experiment”, que consiste em sair da cápsula e ficar no zero absoluto por dez segundos. Que aliás é puro marketing, porque se fosse zero mesmo a gente desintegraria, mas assim mesmo é frio demais, horrível, horrível. O Beto adorou, quer que eu vá de novo, ele vai todo dia, mas não adianta, eu estou de mau humor desde que saí de casa. Só o que estou fazendo o dia inteiro é ler. O casamento não começou bem.

Beijos. Tou com saudades! Papai já está podendo comer comida normal?

* * *

Netuno

Oi Robbie!

Como vão as coisas? Aqui tudo bem. Netuno é extraordinário! Amanhã é o grande dia, quando Plutão vai cruzar nossa órbita e passar tão perto da gente que vai cobrir metade do céu. Tem gente que brinca e diz que vai poder ver os turistas que estão em Plutão acenando de volta para nós, de tão próximo que vamos estar! Essa foto no postal dá uma idéia de como fica. Só acontece uma vez a cada quinze mil anos (terrestres! ;) ) Estou até evitando de olhar pro céu pra que o impacto seja maior no dia de mais proximidade.

Vamos nos encontrar quando eu voltar, OK?

Beijão! Meu e da Carol.

* * *

Urano

Leca querida,

pena você não ter podido vir pra cá. O planeta é praticamente virgem. Infra-estrutura quase nenhuma, estou num bed and breakfast de dois velhinhos muito atenciosos, aqueles que o Lonely Planet recomendava. Passo os dias explorando as ruelas, entrando nos cafés (o croissaint aqui é fora-de-série), conversando com os locais, todos simpaticíssimos. Ontem passei na frente da construção de um prédio enorme, vai ter trezentos andares, daí pra mais. Estavam colocando o letreiro: Holiday Inn. Acho melhor você vir assim que melhorar do pé, porque dia mais dia menos as agências vão descobrir esse paraíso aqui.

Volto em duas semanas. Bitoca!

* * *

Saturno

Alô pai, alô mãe!

Só dando um oi aqui de Saturno. Muito, muito bom isso aqui. Até agora ficamos só circulando nos cassinos e nos bares, mas amanhã vamos finalmente ver os anéis de perto. Tinha muitas excursões reservadas antes da nossa. Vão nos levar num lugar chamado “L’anneau de l’anneau” , que é uma casa noturna construída em volta de um dos anéis. Dizem que tem tudo lá, até o Elvis verdadeiro! Dá até pra ver a casa daqui debaixo. Olhem atrás, na foto, uma mancha laranja redonda em volta do anel branco. É lá!

Pai, dá uma olhada com o banco pra mim pra ver qual é o limite do cartão, estou com medo de estourar. A gente se vê quando eu chegar. Tchau!

* * *

Júpiter

Oi pai.

Consegui hospedagem em Júpiter, te falei que essas coisas não precisa de reserva. Mas é horrível aqui. Não consigo sair da cama, a gravidade é massacrante, deixa a gente exausto. Minha mochila está pesando quase cem quilos, e não tem mais que escova de dentes e duas cuecas. O albergue é uma algazarra a noite inteira, e não sei como esses caras fazem tanto barulho, se nem boca eles têm. Estou com tontura e pressão baixa por causa da gravidade, eu tento pedir ajuda pro dono, mas ele não entende nenhuma outra língua, e pela cara como ele me olha, está pouco se lixando. Mas daqui a pouco acaba. Espero que no cinturão de asteróides seja melhor.

Abraço.

* * *

Marte

Oi pessoal de casa!

Amo vocês! Como estão sobrevivendo aí sem mim? :) Aqui está ótimo, a família me recebeu super bem. Eles são megafofos, todos verdinhos com aquelas anteninhas, que nem nos filmes! Ficam o tempo todo corrigindo minha pronúncia. Adoraram o relógio de ágata, colocaram bem em cima da lareira. Está frio agora, porque é inverno, mas mesmo assim a escola sempre leva a gente pra passeios Esta foto é um desfiladeiro maior que o Grand Canyon, que tem aqui perto, fomos ontem. Semana que vem vamos visitar alguns destroços da Nasa!

Beijinhos! Muita saudade!

* * *

Vênus

Oi paixão,

que saudades de você. Está um martírio essa viagem. As crianças só querem ficar na piscina do hotel, não param de reclamar na hora de sair, é um saco. Eu por mim ficava também, mas tenho que bancar o paizão. E a Elizabeth grita com elas por qualquer coisa, não é à toa que a filha dela é neurótica do jeito que é, e acho que o Pedrinho está indo pelo mesmo caminho. Eu fico pra explodir, mas sou eu que tem que controlar as crises entre os três. Mas o pior mesmo é ficar longe de você. Continua o prometido, assim que eu for promovido, largo essa família e a gente vai morar junto.

Te amo.

* * *

Mercúrio

Oi querida,

desculpe a demora pra escrever. Estou assim de trabalho. Nem precisa ficar com inveja, não consegui sair uma vez sequer. O pior é olhar pela janela do escritório e ver aquela cordilheira de vulcões, os endinheirados voltando do banho de vapores, e eu aqui preso. Ontem, pra piorar, o ar-condicionado central quebrou, tiveram que comprar ventiladores, mas um ventiladorzinho desses não dá conta do calor escaldante. O relógio de pulso de plástico do Mendonça derreteu um pouco na pulseira, e entalou no braço dele. Amanhã é sábado, mas de tarde vou ter que trabalhar também. De manhã vou tentar a massagem com lava fria do hotel, é cara mas estou precisando.

Estou sentindo sua falta.

PS: Ainda não achei o chocolate da sua mãe, mas comprei uma surpresinha pra você!

sexta-feira, dezembro 08, 2006

Mundo

Mais uma pra fila de idéias-hipopótamo, outro desses caminhões atolados que tentam manobrar em cima do barro molhado e engarrafam o fluxo das outras idéias. Se eu fosse por em prática, me consumiria coisa de dois anos, isso com dedicação diária, batendo ponto e sem direito de perder o tesão. Não rola, mas dá pena porque é tão boa que não tenho coragem de descartá-la.

A idéia era de dominação do mundo, mas começa que o meu Mac não é compatível. Mesmo que eu tivesse o último lançamento, este que vem com processador Intel Core 2 Duo, que é tão poderoso e auto-suficiente que não precisa de usuário -– todos os que compram o conservam numa redoma. Até venderia meu PowerBook fuleiro para comprar um novo se isso bastasse para dominar o mundo, mas parece que a versão do Civilization IV para Mac nasceu bichada, o jogo trava no meio sem maiores explicações.

Parêntese pra quem não sabe o que é Civilization IV. Civilization IV é um jogo de computador. Já passei da idade de gostar de games eletrônicos, mas neste há um pano de fundo histórico que ainda me fascina, além da puta jogabilidade. O jogador controla uma entre muitas civilizações reais à disposição, como os astecas, franceses, chineses ou babilônios. Começando no neolítico, tem que fazer essa civilização evoluir, fundando cidades, fazendo descobertas científicas e montando exércitos. O que o torna essencial pro meu hipopótamo é a diferença para os concorrentes do mesmo estilo: em vez de ser disputado em tempo real, os jogadores se alternam em turnos. Cada ano é uma nova rodada, as civilizações se movimentam e combatem uma por vez.

Essa é a condição ideal para que o jogo seja narrado num blog.

É o seguinte: cada turno é um post novo. Uma partida costuma ter cerca de 600 turnos, daí a necessidade de dois anos de vida presos nesse projeto, partindo do princípio que eu escrevesse todo dia. No primeiro post, um narrador, escondido numa bibliotecade uma cidade em ruínas, começa a questionar em que momento sua civilização começou a se ver como tal. Ele enxerga sinais de que o fim já aconteceu, seja na quantidade de emboscadores nas ruas, que superam o número dos que fogem das armadilhas, ou nas traças das estantes, que devoram mais livros do que a capacidade de reposição da biblioteca. Por isso, se debruça em pesquisas em busca dos números opostos, que lhe dissessem em que momento passou a haver menos emboscadores que emboscados, e mais escritores do que traças. Em seus estudos, estabelece como marco inicial a data de fundação da primeira cidade, 4000 a.C.. No segundo post, estaremos nesse ano.

A partir de então, cada turno será narrado por uma unidade, podendo chegar a um máximo de dez narradores em rodízio. O acaso pode selecionar um cavaleiro no calor do cerco a uma cidade inimiga ou um mineiro de uma ilha remota, mas as unidades vão falar apenas do seu entorno, não importa que o pau esteja comendo em outro continente; se a rotina dela for contruir uma irrigação numa planície, este será o seu assunto principal, podendo ou não pincelar sobre os eventos principais acontecendo em paralelo.

Acho que esse blog seria um experimento fantástico de escrita restritiva, essa que te impõe regras e temas e você tem que se virar em cima do que foi dado. No final da história, a civilização pode ser destruída ou dominar o mundo, de acordo com o meu desempenho no jogo. Mais legal ainda seria brincar com os desdobramentos de cada episódio na cabeça dos narradores. Digamos que uma unidade exploratória se confronte no início do jogo com uma unidade bárbara, e ganhe a luta. O que na hora pode ser narrado em primeira pessoa por um scout em pânico. que vence a batalha por acidente, pode, ao longo dos turnos, ser elevado a um feito heróico e depois a uma lenda contada por escrito em alguma epopéia clássica. Uma cidade tomada pelo inimigo pode levar os personagens a uma demanda por guerra santa a qualquer preço, o que por sua vez pode me forçar a, pressionado pela minha própria invenção, tentar retomá-la imprudentemente, e cada atacante sem sucesso ganha homenagens da unidade camponesa que trabalha abrindo estradas e tem um medalhão com a efígie do herói.

E por aí vai, são muitas possibilidades. Mas não dá, preciso de dois anos impossíveis de dedicação diária. Ninguém aí se empolgou e quer participar escrevendo em revezamento?

Profile

Rodrigo Rego

Sou designer, fascinado por bandeiras, jogos de tabuleiro, países distantes, e uma miscelânea de assuntos destilados quase semanalmente neste espaço.

Visite meu site, batizado em votação feita aqui mesmo, Hungry Mind.

rodrego(arroba)gmail.com
+55 21 91102610
Rio de Janeiro

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