quinta-feira, março 29, 2007

Suvaco do Cristo

Esse desfila pelas ruas Faro e Jardim Botânico. Foi um dos primeiros da nova geração de blocos cariocas, com o primeiro desfile em 1986, um ano depois do Simpatia. Mas ao contrário do antecessor, o Suvaco tem um espírito bem mais sacana e político, com sambas pouco ligados à tradição e muito afeitos ao aqui agora da cidade. As letras funcionam como crônicas e não como poesia, tendência que é imitada por vários blocos mais recentes. O Cristo do nome, claro, é a estátua do Corcovado, cujo suvaco direito fica bem em cima do itinerário do bloco.

As bandeiras do Suvaco do Cristo foram as que mais demoraram a sair. Foram as primeiras a serem esboçadas e as últimas a serem finalizadas, porque seu conceito era o mais difícil de captar. Como os temas do bloco costumam girar em torno de atualidades, fica difícil fazer um retrato sem prazo de validade. Por isso não podiam aparecer nas bandeiras menções ao governo Lula, apagão aéreo, Pan 2007, ou qualquer tema que fosse notícia do ano mas se tornasse ultrapassado logo depois. Mas ao mesmo tempo, tinha que ficar claro que o Suvaco era um bloco que zombava da política e do cotidiano do Rio.

A idéia final foi descer o Cristo de seu pedestal nas alturas e misturá-lo ao caos urbano carioca em quatro bandeiras-ambiente: na favela, na praia, no trânsito e dentro do próprio bloco. Os ambientes da bandeira são compostos por recortes modulares, que diminuem o tempo de confecção apesar da complexidade. As cores do bloco, verde e azul, são predominantes, mas são esporadicamente quebradas por cores quentes, imepedindo a monotonia. As bandeiras funcionam em três tipos de combinação: sozinhas, como na rua Faro, com vários cristos lado a lado, formando uma corrente de cristos em diferentes ambientes, e com um cristo isolado em meio a outras bandeiras semelhantes.

sábado, março 24, 2007

Uma ideia pro Big Brother

O Big Brother vem desde a primeira edição no Brasil sofrendo um processo de transformação gradual. De reprodução da sociedade em microcosmo, como tentou ser no início, quando só duas das mulheres eram loiras, para a novelinha que é agora. E eu acho que esse processo é bom. Hoje todos os participantes saíram de uma fábrica dentro do Projac, que exagera em peitos e economiza em miolos, o que também é bom, porque gente burra briga e fode mais freqüentemente do que gente inteligente, mais ainda se além de burras forem bonitas. Com moradores tão previsíveis, fica mais fácil condensar as vinte quatro horas de convívio numa novela de meia hora, em que a cada um cabe um papel novelesco, seja herói, heroína, vilão, capangas, alívio cômico, etc. O problema é que os personagens às vezes agem contra o script, o que pode resultar em acidentes como a eliminação prematura do Caubói, inimigo público número um da vez, o que deixou o programa ao mesmo tempo sem vilão e sem par romântico, já que o ele fazia parte também do último casal remanescente. Agora, a duas semanas do final, temos um herói, quatro coadjuvantes e nenhuma perspectiva de reviravolta.

Minha idéia, não sei como ninguém teve uma dessas antes, era fazer do Big Brother uma novela de verdade. Com atores da Globo. Pares românticos mais duradouros e polêmicos, vilões que se mantém até a reta final, tudo em horário nobre, depois do Jornal Nacional. O esquema pode ser igual. Quinta é prova do líder, sábado (porque domingo é dia de Fantástico) definição do paredão, e na terça um deles cai fora. Se bobear, por votação popular mesmo, para dar uma interatividade à história, tipo Você Decide, e ainda revela quais são os atores mais populares. O grande vilão, claro, pode até ser volta e meia indicado para o paredão, mas tem um estratagema de manipulação de votos, seja vírus nos computadores centrais, seja o que for, que só vai falhar quando for confrontado, no último paredão, com a popularidade avassaladora do herói (e mesmo assim, por pouco).

Os personagens eliminados saem mesmo da história, mas se forem muito populares, podem fazer uma ou outra intervenção, como tentar pular o muro da casa para rever o grande amor, ou fazer declarações polêmicas enquanto posa pelada pra playboy. Os momentos de paredão têm que ser de grande tensão. Os personagens, ao ver suas famílias pela televisão, podem reconhecer o pai perdido, ou ao se despedirem dos amigos quando eliminados, podem fazer uma revelação tipo “eu sei que você tem uma irmã gêmea malvada”. Nos relacionamentos, os brothers ficcionais seriam muito mais volúveis, trairiam o par com alguém ali de dentro mesmo sem deixar o outro saber, brigariam e se reconciliariam com mais freqüência. Nas estratégias, podem ser muito mais sofisticados, com personagens infiltrados nas panelinhas inimigas pra descobrir como vai ser a combinação de votos do lado de lá. Nas tomadas, as câmeras podem ser muito mais despudoradas nos closes de bundas e peitos, e edição não vai mais ter momentos de silêncio ou em que todos falam ao mesmo tempo, e ninguém entende nada.

A novela duraria três meses. No final, ficam na casa só o vilão e o mocinho, o Alberto fictício (digamos, Selton Mello) enlouquecido com a faca de cozinha no pescoço do Alemão (sei lá, Dado Dolabella), dizendo que se não ganhar o milhão final lhe rasga a garganta, e o público votando nele com medo de o herói morrer, e acaba que ele ganha mesmo. O Alemão sai cambaleante e encontra à sua espera a Siri (Mel Lisboa), que tinha sido eliminada dois paredões antes, e os dois saem pobres e felizes nos braços do povo. O Selton Mello sai rico e vai preso, a mensagem final é que dinheiro não traz felicidade, enquanto o Lázaro Ramos, que foi o terceiro colocado e era o alívio cômico da novela, ganhou um Audi num sorteio e termina dando carona pra várias gatas apesar de feio.

quinta-feira, março 22, 2007

Banda de Ipanema e Simpatia E Quase Amor

São dois blocos que além de dividirem o mesmo trajeto, compartilham alguns personagens históricos e a filosofia. A Banda nasceu em 1965, e varou os anos setenta usando o hedonismo e a liberdade sexual como forma de contestar a ditadura. Quando acabou a ditadura, ficou só o hedonismo e se transfigurou num bloco gay. O Simpatia começou em 1985, em meio ao renascimento cultural carioca impulsionado pela abertura e as Diretas Já. Também pregava em seus sambas o hedonismo e a liberdade, e por isso foi considerado herdeiro direto da Banda, mas adicionou à fórmula uma exaltação às tradições carnavalescas e à carioquice ipanemense.

Com tanta coisa em comum nos dois blocos, quis que as bandeiras mostrassem essa ligação. Escolhi como símbolo para representá-los o coração, que além de passar bem o conceito, é graficamente simples e fácil de se reconhecer, ideal para uma bandeira. Melhora ainda, é versátil, e dependendo da posição em que fica e dos elementos ao lado, pode se parecer também
com uma bunda, uma vagina, várias partes do corpo feminino. Acabei colocando-o virado de lado, representando uma boca pronta para um beijo. Depois pus um olho fechado em cima e adereços diversos, como cabelos e chapéus, formando as bandeiras beijoqueiras.

Cada par tem uma bandeira vermelha e amarela, cores da Banda de Ipanema, e uma amarela e roxa, cores do Simpatia É Quase Amor. O beijo da bandeira do Simpatia na bandeira da Banda simboliza a ligação dos dois blocos e a anarquia romântica que os dois estimulam em seus desfiles.

A boca em forma de coração e o olho fechado são comuns a todas as bandeiras. Os adereços é que as tornam diferentes, formando quatro personagens distintos que povoam o universo dos dois blocos – os ícones do carnaval carioca do Simpatia (o malandro, a mulata) e os estereótipos marginalizados sexualmente da Banda (a puta, a bicha). Não há regras que determinem qual personagem deve beijar qual, todos beijam todos, desde que as cores dos dois blocos estejam representados no par.

Por fim, um brinde aos observadores mais atentos: o folião que prestar atenção vai ver que não são só bocas que podem ser beijadas nas bandeiras…

As fotos são simulações de uso nos três trechos do trajeto: praça General Osório, rua Teixeira de Melo e Av.Vieira Souto.


segunda-feira, março 12, 2007

Carnaval de Bandeiras

Motivos não me faltam pra detestar carnaval de rua antes mesmo de ousar colocar uma ponta do dedão do pé no mesmo asfalto por onde passe um bloco. Não gosto de muvuca, de catinga, não bebo cerveja, não tolero marchinha de carnaval, nem sou fã da megalomania hedonista de contar mulher às dúzias. Daí o meu espanto ao constatar em julho passado que eu passaria todo resto de 2006 e início de 2007 trabalhando com esse tema no meu projeto final.

Minha primeira proposta foi recusada pela banca de orientadores no início do ano. Como eu não tinha mais cartas na manga, a solução foi seguir a recomendação dos professores e trabalhar com um tema que me interessasse. A primeira coisa que me passou na cabeça: bandeiras. Bandeiras têm tudo a ver com comunicação visual. A atividade símbolo de um designer gráfico, aquela que ninguém exercecom a mesma competência que ele, é a concepção de identidades visuais, ou seja, marcas e seu sistema de aplicações para empresas. E assim como as marcas representam uma empresa graficamente, as bandeiras fazem o mesmo por nações e ideologias. Eu coleciono bandeiras desde pequeno, e volta e meia escrevo alguma coisa aqui sobre elas, como esse texto e esse. Mas essa atração nunca teve muito a ver com design, eu gostava por mera curiosidade enciclopédica. Quem sabe um projeto final de graduação pudesse tornar esse interesse mais aproveitável.

A banca gostou do tema. Mas você vai fazer bandeiras do quê? Um redesenho da bandeira brasileira? Uma bandeira para a universidade? São propostas que não dão tesão e nem de longe têm a complexidade que um ano de trabalho pede. Então eu achei um livro sobre um festival de bandeiras em Valencia, Espanha. Dezenas de artistas tinham projetado bandeiras para a ocasião. Bandeiras que rompiam completamente com as convenções. Bandeiras com texturas, com combinações de cor loucas, geometria inusitada, bandeiras que davam um nó, se enrolavam sobre si mesmas, bandeiras tridimensionais. E que ficavam expostas na rua, uma depois da outra, decorando a cidade. Inspirado no livro, decidi que meu projeto seria uma decoração de rua feita com bandeiras de vanguarda. Faltava achar um bom motivo para pendurá-las.

Pensei no Pan. Pensei em feriados importantes, eventos culturais, mas em qualquer caso as bandeiras serviriam apenas como enfeite. O carnaval de rua surgiu com a lacuna perfeita para o projeto preencher, ou seja, problemas que seriam bem solucionados coma colocação de bandeiras nas ruas. A idéia é colocá-las ao longo do trajeto dos blocos de carnaval, cumprindo quatro funções:

- enfeitar a cidade para o carnaval. A festa é o evento mais importante do calendário da cidade e ela não ganha uma maquiagem à altura. Com bandeiras seguindo o trajeto dos principais blocos, a decoração ainda ganha um caráter orgânico, obedecendo a geografia festiva criada pelo povo;
- sinalizar o trajeto dos blocos in loco, para quem quer pular carnaval e para quem quer manter distância;
- chamar a atenção do carioca e do turista para o carnaval de rua, muito mais vigoroso que o oficial;
- dar personalidade gráfica aos blocos, criando coleções de bandeiras para cada um.

O projeto se dividiu em duas partes: elaboração das normas para confecção e colocação de bandeiras em qualquer rua do Rio e design de bandeiras para quatro blocos, exemplificando o projeto. Já a pesquisa se dividiu em três áreas completamente distintas: um levantamento sobre os quatro blocos escolhidos (Simpatia É Quase Amor, Banda de Ipanema, Suvaco do Cristo e Gigantes da Lira), uma pesquisa sobre o mobiliário urbano carioca, que serviria de suporte para a decoração, e uma análise da linguagem gráfica das bandeiras.

Todo o projeto foi pensado para que os próprios blocos fossem capazes de confeccionar e até instalar suas bandeiras, por isso a produção recomendada é artesanal, e a montagem foi projetada com materiais baratos e simples de instalar.

Nos próximos posts, vamos falar um pouco dos estudos de caso desenvolvidos para o projeto, ou seja, as bandeiras desenvolvidas para cada bloco.

quinta-feira, março 08, 2007

Relação de coisas incomuns que eu fiz para me formar

- moer pedrinhas de anti-mofo com um socador de carne;
- derramar um vidro de esmalte incolor no braço em cima de uma escada de madeira, a dois metros de altura do chão;
- pesquisar sobre as pipas gigantes da Guatemala;
- visitar duas fábricas de bandeiras;
- visitar o consulado da China;
- contar o número exato de postes em várias ruas;
- medir, em passos, as distâncias entre postes transversais e paralelos;
- falhar na tentativa de colar tecidos de nylon com os mais variados tipos de possíveis adesivos, de Superbonder a verniz para madeira;
- ir a um ensaio de bloco de carnaval;
- freqüentar as ruas do Saara, no centro do Rio pelo menos três vezes por semana;
- fotografar e mapear as decorações de rua feitas para a Copa do Mundo de 2006;
- fotografar e mapear outras 17 ruas no Rio de Janeiro, do Leblon à Saúde, passando por Santa Teresa.

Sim, foi um ano bizarro, especialmente os últimos dois meses, nos quais tive que relegar esse espaço a um segundo ou terceiro plano. Espero exorcizá-lo de vez ao expor aqui nos próximos posts o meu projeto final de formatura. Um doce pra quem adivinhar do que se trata só com as pistas dadas ali em cima.

Profile

Rodrigo Rego

Sou designer, fascinado por bandeiras, jogos de tabuleiro, países distantes, e uma miscelânea de assuntos destilados quase semanalmente neste espaço.

Visite meu site, batizado em votação feita aqui mesmo, Hungry Mind.

rodrego(arroba)gmail.com
+55 21 91102610
Rio de Janeiro

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