quinta-feira, outubro 23, 2008

A camisa do Heerenveen

Sintonizei a TV hoje a tarde e me detive na Record, que passava um jogo do Milan. Assisti à partida alguns minutos e de repente reparei que a camisa do time adversário era idêntica à bandeira da província holandesa de Friesland, minha quinta na lista de bandeiras favoritas, e provavelmente uma das mais estranhas entre todas as bandeiras.

Aquela estampa numa bandeira é esquisito, imagina numa camisa. O time autor da proeza é o Heerenveen.

Olha como até o escudo deles tem os coraçõezinhos. Parece um time patrocinado por um leite longa vida.

segunda-feira, outubro 20, 2008

iPod Shuffle

Bolei um conceito para uma nova banda de rock, dessas que surgem bombando na Inglaterra e caem no esquecimento seis meses depois. Iria se chamar iPod Shuffle.

No show, depois de cada música, o vocalista aperta um pedal que determina aleatoriamente a próxima música. Fica abolida toda a ciência que decide a ordem do show, que prega que tem que começar forte, deixar as baladinhas pro meio e terminar com a casa vindo abaixo. Fica tudo por conta do shuffle do pedal.

Uma outra engenhoca, parecida com um aplausômetro tipo show de calouros, avalia a reação do público. Se estiverem vibrando muito, a banda dá repeat na música. Com silêncio ou vaias, ela é obrigada a interromper e tocar a próxima.

O grupo teria um repertório de cerca de 100 músicas, a maioria de bandas indie, tipo Belle & Sebastian, Los Hermanos e White Stripes. Umas 20 seriam coisas mais antigas, como U2, Blitz, Elvis e Tim Maia. E 10 poderiam ser daquelas nada a ver, que quando aparecem no shuffle na frente dos amigos a gente corre pra pular antes de aumentar o estrago. “Take my breath away” do Top Gun, “Então é Natal”, na voz da Simone, a música dos bichinhos da Parmalat, “Cavalgada das Valquírias” na versão acelerada do Degrau do Inferno, essas coisas.

Pra dar o clima de shuffle, a banda tem que ter vários vocalistas, e de preferência assumir várias formações: com e sem metais, mellotron, tudo acústico ou só no pianinho. E melhor ainda, reajustar os amplificadores a cada música para tocar cada uma num volume.

Difícil arrumar gente tecnicamente apta para a empreitada, eu sei. Eu gostaria de fazer parte, mas meu dom musical se limita a tocar o “Dó-ré-mi” da Noviça Rebelde na flauta doce. Se bem que, seguindo a filosofia da banda, dava até pra fazer uma participação especial.

* * *

Outra possibilidade é aprender a lição de Borges, que diz que é melhor resumir uma idéia em 5 linhas do que espalhá-la por 500 páginas. Ou seja, em vez de uma banda, podíamos então fazer só uma música com o nome de iPod Shuffle.

A música teria a letra deste post, até antes dos asteriscos. Cada parágrafo tem um ritmo diferente. O primeiro é rockabilly. O segundo é um partido alto. O terceiro é sertanejo. O quarto, que é o maior, vai no embalo de Faroeste Caboclo. O quinto é gangsta rap e o sexto é Guilherme Arantes. Entre o terceiro e o quarto tem um jazz instrumental e entre o sexto e o sétimo toca drum ’n’ bass. Pronto, hit instantâneo.

segunda-feira, outubro 13, 2008

Fernando Gabeira

Dizem que os altos figurões da Globo têm um jogo interno de manipulação do eleitorado. Sarro puro mesmo, sem ambições políticas. Uma eleição ou outra, pegam um sujeito qualquer para candidato, manipulam a mídia, e não tem erro, no final o cara está eleito. Às vezes até competem com dois diferentes no mesmo pleito para dar mais graça.

Depois se a coisa ficar feia depõem o eleito, porque a ninguém interessa também o país indo pro buraco. Foi o caso do Collor por exemplo.

Gabeira é a mesma coisa. Aliás, Gabeira é um caso especial. O jogo de manipulação do eleitorado, de tão fácil, já não dava mais barato. Os figurões da Globo estavam voltando para a cocaína. Preocupados com a produtividade em queda, os executivos resolveram subir o sarrafo. De duas maneiras:

1: Gabeira é de longe o mais improvável dos candidatos. Seu passado real: é funcionário público aposentado do almoxarifado do Museu da Imagem e do Som. Simpático, mas meio pancada da cabeça, dizem. Depois da aposentadoria mal saía de casa, assistia novela e os slides de uma viagem feita na juventude para Saquarema.
2: O objetivo dessa vez era eleger um candidato só com o apoio da elite. Nada de se sustentar no povão. Vamos manipular os jovens e os intelectuais, brincar com a cabeça dos mais críticos e dos mais independentes.

Mas como se transforma um zé-ninguém em modelo aspiracional de quem já está no topo da pirâmide social? A Globo precisou trabalhar a história e os ideais de Gabeira. Primeiro foram montagens fotográficas, espalhadas nos arquivos dos jornais para inventar seu passado. Gabeira anistiado, porque jovens e intelectuais adoram quem lutou contra a ditadura. Gabeira de tanga, porque adoram também as idéias avançadas.









É difícil de perceber, pois são montagens quase perfeitas. Mas olhando de perto vê-se que duas das "fotos de arquivo" de Fernando Gabeira, uma na praia, de tanga, e outra voltando do exílio, têm exatamente o mesmo rosto.


Bruno Barreto ajudou também, inserindo Gabeira no seqüestro do embaixador americano em seu filme “O que é isso, companheiro?”.

E depois o golpe de mestre: entraram com o aposentado Gabeira congresso adentro, colocaram ele gagá no microfone para soltar o famoso “Vossa excelência está em contradição com o Brasil!” diante de um atônito Severino Cavalcanti e uma câmara que não entendeu nada. Carregaram ele pra fora antes de a segurança chegar, e a imagem ficou gravada para entrar na história como símbolo do combate à corrupção no país.

Juntando uma história como essa e uma campanha que defendia as ruas livres propaganda e o discurso em alto nível, os figurões da Globo conseguiram transformar o aposentado Gabeira em xodó da elite pensante da cidade. E ela mesmo se encarregou de levá-lo para as outras classes sociais.

Os outros políticos como reagem? A maioria caiu no conto, como nós. Encara um adversário quase autista com excesso de respeito, colaborando para propagar a mentira. Gabera vai debatendo com eles e desfiando associações ilógicas como patinete para a polícia, avião contra a dengue e googlemaps contra as favelas. Qualquer outro não daria papo, mas da boca de alguém com tanta história e idéias tão avançadas, parece uma revolução.

Os poucos que sabem da verdade não conseguem se comunicar conosco pelos veículos tradicionais, todos da Globo. Espalham folhetos apócrifos, como o que li para escrever este post.

Outros passados inventados:
Michael Phelps
Passados inventados de celebridades mentirosas

quarta-feira, outubro 08, 2008

Por que não escrever ciência ficcional

A maior dificuldade -— aliás, impossibilidade — de se fazer uma obra de ciência ficcional (lembram? como o livro de química básica inventada deste post) é não cair: 1- no tédio e 2- na falta de imaginação.

Pois um livro científico ficcional é de qualquer jeito um livro científico, o que o torna quase que por definição massante, impossível de se acompanhar com o mesmo tesão de um romance.

Além disso, e bem mais grave, é que a provável falta de conhecimento do autor vai acabar tornando sua obra rasa. É preciso ter total domínio de um tema para poder subvertê-lo. PNo caso da química inventada, provavelmente há que se saber a fundo não apenas química moderna, mas também a antiga, a alquimia, as superstições e todas as teorias fracassadas anteriores, e conseguir daí extrair uma amálgama que sirva de base para uma lógica nova.

Senão, corre-se o risco de essa lógica se transformar numa paródia da química atual, baseada nos mesmos parâmetros, mas negando-os.

Andei pesquisando, e descobri que evidentemente já foram feitas algumas tentativas de obras científicas ficcionais. E das que encontrei até agora, mesmo a mais ambiciosa continua mal-sucedida. Se chama Codex Seraphinianus, um tratado naturalista sobre um mundo desconhecido. Escrito num alfabeto desconhecido, inclusive — bacana — com exceção do título — primeira grande falha.


O livro não vai muito além de plantas que andam e peixes com um olho na barriga. E ainda tem momentos grotescos, como o casal que ao copular se transforma num crocodilo (e que ganhou a capa!).

Acredito que o autor se esforçou, estudou pra burro, mas nunca conseguiria arranhar a inventividade de tudo que a ciência à vera catalogou em milhares de anos.

Por isso que passei a admirar Jorge Luís Borges. Acabei de reler o conto Tlön, Uqbar, Orbis Tertius, em que ele usa um artifício genial para criar a sua própria enciclopédia de um planeta diverso. Sabendo que nunca iria conseguir igualar a riqueza de uma enciclopédia verdadeira, Borges escreve apenas um ensaio sobre a enciclopédia ficcional. De uma cajadada só, poupa o leitor do tédio e se desvencilha da árdua tarefa de pormenorizar toda a natureza e ciência de Tlön.

O único campo do conhecimento em que ele realmente se detém é a linguística — e aí ele deita o cabelo ao descrever como um idioma sem substantivos pode influenciar todas as outras esferas do pensamento. Nos outros, espalha umas poucas pílulas, que pela pequena quantidade, são genuinamente criativas, como ao descrever as escolas de pensamento tlönistas sobre o tempo. São cinco, vou citar três:

- “Uma das escolas de Tlön chega a negar o tempo: argumenta que o presente é indefinido, o futuro não tem realidade senão como esperança presente, que o passado não tem realidade senão como recordação presente”;
- “Outra escola declara que todo o tempo já transcorreu e que nossa vida é apenas a recordação, ou reflexo crepuscular, sem dúvida falseado e mutilado, de um processo irrecuperável”;
- e minha favorita: “o universo é comparável a essas criptografias que não valem todos os símbolos e que só é verdade o que acontece a cada trezentas noites”.

E assim ele cria a percepção de um planeta com ciência e filosofia vastamente ricas sem precisar ir a fundo. Ou como diz no prólogo o próprio Borges: “Desvario trabalhoso e empobrecedor o de compor vastos livros; o de espraiar em quinhentas páginas uma idéia cuja perfeita exposição oral cabe em poucos minutos. Melhor procedimento é simular que esses livros já existem e propor um resumo, um comentário”.

sexta-feira, outubro 03, 2008

Criptocríticas: horário político

Já que todo dia somos submetidos a dois tempos de meia hora de propaganda eleitoral, muito me admira que ninguém tenha tido a idéia de criticar os programas dos candidatos. Crítica não de conteúdo, claro, que é irrelevante. Qualquer tentativa de sustança some debaixo de tanta maquiagem, esta sim o assunto da nossa análise.

Eduardo Paes
Graças a um programa penteadinho como seus cabelos, Paes está liderando a corrida. Pura perfumaria: jingle estilo “Pra ficar legal”, apresentadora negra cool com cancha de jornalista, fundinho branco, vinhetinhas. Quando vi da primeira vez, pensei, dançou. Mas pelo visto a fórmula ainda dá pano pra manga.

Marcelo Crivella
Este vive se queixando de que seu tempo é curto, mas se aparecesse mais talvez o estrago fosse maior. O programa chupou todas as qualidades do segundo candidato mais carismático das eleições. Substituíram seu jeito manso por uma postura de general marchante que olha firme, cheio de letras sensacionalistas atrás. Fora a pinta de galã tardio, que desmorona com uma iluminação que refrata rugas por 29 polegadas.

Fernando Gabeira
Ele me ganha sempre depois do “Boa noite, obrigado pela atenção” com que termina o programa. Seu discurso franco, sem dramalhão e sem bravatas cria uma persona diferente dos outros candidatos. Gabeira é o único que não usa termos como “o futuro de nossas crianças”, “povo sofrido” e não faz documentário com a Dona Marlene que precisa pegar 4 conduções pra ir ao trabalho. Mas talvez por isso, durante muito tempo a propaganda ficou um pouco comedida. Só agora, no finalzinho, conseguiram dar à sua candidatura o tom messiânico que ela devia ter desde o início. Tomara que não seja tarde demais.

Jandira Feghali
Tentou se apresentar como doutora e mãezona, mas como não saía do terceiro lugar, resolveu abrir o verbo e aí é que afundou mesmo.

Solange Amaral
Eu ia descascar o programa da Solange, mas ontem sonhe que ela pulava entre prédios e me apresentava toda solícita várias obras da prefeitura. Acordei quase votando nela. É gente fina a Solange.

Alessandro Molon
No início, ninguém entendi aporque só o mostravam olhando para o lado, falando com um interlocutor ausente. Mas o motivo veio em seguida: com sua cara incrivelmente simétrica, Molon fala sem piscar nem mexer outro músculo além da boca. Assusta. É praticamente um vereador com 10 minutos de TV.

Chico Alencar
É o que melhor aproveita o pouco tempo que tem, com um discurso duro contrastado por um visual ensolarado. Não apresenta propostas, só marca posição. Mas também com esses poucos segundos, melhor não perder tempo com bobagem.

Paulo Ramos
É como se o taxista mais taxista estivesse concorrendo à prefeitura. Voz áspera de tanto fumar, bigodão, palavras de ordem, teorias da conspiração e zero senso de realidade.

Filipe Pereira
Ele fala. Colocando uma pausa. A cada. Três palavras. Por quê?

Vinicius Cordeiro
A biblioteca atrás empresta profundidade às suas palavras, mas até agora ele não disse uma linha que não fosse embromation.

Eduardo Serra
Parece vir da área bacana, cuca fresca do comunismo, mas nunca me esqueço da frase “temos que seguir o exemplo vitorioso da Bolívia e Venezuela”.

Antônio Carlos Silva
Nos 15 segundos de que dispõe, ele consegue falar do pré-sal, do MST, dos capitalistas, do proletariado, das privatizações, dos estrangeiros, só não fala do Rio.

Profile

Rodrigo Rego

Sou designer, fascinado por bandeiras, jogos de tabuleiro, países distantes, e uma miscelânea de assuntos destilados quase semanalmente neste espaço.

Visite meu site, batizado em votação feita aqui mesmo, Hungry Mind.

rodrego(arroba)gmail.com
+55 21 91102610
Rio de Janeiro

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