segunda-feira, outubro 31, 2005

Os dez mais

Aprendi com um filme chamado Alta Fidelidade a relevância de ranquear as próprias preferências. As listas de dez mais, para muitos puro jogo publicitário, me são fundamentais para conhecer meus próprios gostos. Sabendo, por exemplo, quais são as minhas dez bandas preferidas, descubro de que estilo musical gosto mais, ou tabelando o resultado por país de origem ou década, aprendo de onde e de que época são as músicas que mais me agradam. Tudo embasado pela certeza dos números, a estatística é o mapa astral dos céticos.

No filme, um vendedor de LPs listava suas músicas favoritas em diversas categorias, que variavam entre as melhores primeiras faixas de discos de rock até as melhores canções pra se escutar almoçando. Mas ele fazia tudo de supetão, puxando pela memória, inconseqüente. As minhas listas são mais cuidadosas, os critérios de seleção lapidados ao longo dos anos, as justificativas as mais coerentes possíveis. São tão cheias de dedos as listas que achei melhor levar a sério apenas três: melhores músicas, melhores livros, e a mais sólida delas, a de melhores filmes, na qual Alta Fidelidade ocupa orgulhosamente o segundo lugar.

Ou ocupava. Passou uma tempestade nela hoje, momento de crise que tem ficado cada vez mais raro. O frescor do início, quando as mudanças de posição se acumulavam a troco de pouco mais do que o humor de cada dia, acabou sedimentando a poeira e dando lugar a baluartes imunizados pela tradição. Por mais que se tente ser racional, não dá pra evitar o respeito por filmes cuja parceria com a lista é tão longa. Por melhor que seja um novo lançamento, não se pode concedê-lo uma posição nos dez mais descartando A Vida de Brian, por exemplo, que é o filme mais engraçado do mundo. Ou ignorar o êxtase visual de Moulin Rouge, ou rejeitar o próprio Alta Fidelidade, que foi quem deu origem a todo esse pensamento.

Mas a tempestade está forte, vai remexer em território que eu antes evitava, vai cavar um buraco na marra pra entrada do duo Antes do Amanhecer / Antes do Pôr-do-Sol. O segundo eu assisti no cinema, e de novo enquanto viajava de ônibus pra Dinamarca. É a história de um casal que se reencontra, nove anos depois de uma noite única que passaram juntos, e de como a memória dessa noite ainda os assombra e serve de parâmetro para desprezarem todos os seus relacionamentos posteriores. O primeiro eu vi ontem. E revi hoje. Ele mostra o que foi a tal noite da qual os dois não se esquecem, que projetou uma luz de esperança sobre a rotina insossa dos personagens, e que durante nove anos fica acesa atrapalhando o sono, até o filme seguinte apagar.

O segundo é melhor. Não só porque o tema é mais complexo, mas por levar à perfeição a estrutura narrativa de colocar os dois personagens tagarelando sem cortes ininterruptamente. O primeiro têm quebras, silêncios, e algumas distrações externas ao casal, quando a gente quer mais é vê-los verborragindo. Mas filmes sensacionais dispensam análises objetivas, apontar problemas fica com cara de mesquinharia. Não vou me apequenar racionalizando detalhes diante de um filme que é como um marinheiro te dando um nó na garganta, amarrando a corda no gogó e tacando a âncora esôfago abaixo.

Racionalizar, qual é o sentido, ordenar e categorizar gostos feito uma estante de biblioteca? Como se os personagens do filme, ao tentar racionalizar seu amor e decidir não trocar telefones para conservar a tal noite pra sempre numa redoma, não tivessem cometido o grande erro de suas vidas. Por isso, se minha lista de filmes passar mesmo no olho do furacão, ela deixa de existir depois de ver a dupla Antes do Amanhecer / Antes do Pôr-do-Sol. Mas se eu agüentar a barra e sofrer só os efeitos colaterais, a lista muda radicalmente, com a dobradinha assumindo a segunda posição e mandando pro limbo Alta Fidelidade, o filme da racionalidade por excelência.

O que, simbolicamente, dá no mesmo.

quarta-feira, outubro 26, 2005

Eu nao gosto de design

Médicos fumam. Dentistas botam aquela máscara no rosto pra esconder os dentes podres. Costureiras usam roupas velhas e arrumadeiras não se acham na bagunça da própria casa. Espetos de pau, os únicos que ainda usam são os ferreiros. E diz a lenda que a contradição cresce exponencialmente segundo a qualidade do profissional, por isso faço muito bem em não gostar de design.

Não compro objetos de design. Nunca escolhi móveis numa loja de decoração chique, não compro máquinas fotográficas por serem bonitas, não endosso uma companhia porque sua marca é sedutora. Capas de livro e CD nunca exerceram sobre mim um poder de atração especial, quando me pego atentando para uma específica costuma ser por puro interesse profissional. Dizem que o design é o diferencial agora que os preços e a qualidade dos produtos se igualaram, dizem tanto que ninguém se lembra da última vez que foi ao supermercado quando repete essa verdade estabelecida pelo cansaço. Pra mim design não é um critério na decisão entre tirar A ou B da prateleira, o critério é preço. Levo sempre o mais barato a menos que haja uma diferença gritante de qualidade. Mas e se o preço e a qualidade forem os mesmos? Levo o que já tiver provado antes. E se os dois forem novidade? Tiro no par ou ímpar. E se o preço não estiver disponível, a qualidade for desconhecida, os dois estiverem igualmente distantes do seu alcance, as informações na embalagem estiverem escritas em alfabeto cirílico e alguém baixar uma lei proibindo o unidunitê? E se, e se, e se; se em algum momento todas essas condições estiverem presentes, o design realmente passa a ser um fator decisivo: levo o mais feio, que provavelmente é o mais em conta.

Também não estou em sintonia com o mundo da moda, não porque queira burilar meu próprio estilo, mas por nem pensar no assunto. Uso qualquer pijama que me aparecer pela frente, derramo geléia em cima e continuo usando. Pouco me interessa o aspecto estético de um produto, não me dizem nada perfumes, relógios, luminárias, nem qualquer artigo que o design tenha ajudado a transformar em mito. E não é por desilusão com a profissão, estou com ela bastante satisfeito, embora o curso, ao habilmente se denominar desenho, acabe cooptando a nós que desde pequenos sonhamos em artefinalizar os quadrinhos da Turma da Mônica. Não que eu tenha entrado desinformado, mas se o nome fosse Projeto Industrial eu não me dedicaria tanto a descobrir do que se tratava.

E gostei do que descobri, não da mística em torno da compra, mas da que envolve o processo criativo, do ambiente saudável que mistura elocubração e prática, da válvula de escape para as idéias amalucadas, dos resultados concretos que podem ficar expostos em qualquer vitrine e dos aplausos pelo trabalho bem feito. Mas comprar que é bom, nunca compraria.

Ainda bem que o mundo não é feito só de pessoas como eu. Se fosse, pessoas como eu estariam desempregadas.

quarta-feira, outubro 12, 2005

Les bandes dessinées

Que design é arte, já chegamos a essa conclusão. Estou interessado agora em saber o quão nobre é a arte do design, poraue todos sabem, existe arte maior e arte menor. O melhor teste pra precisar o nível de exigência estética e intelectual de cada tipo de arte é o dos macaquinhos. Lembram deles? Aqueles que se deixados aos milhares pela eternidade sapateando em computadores podem escrever uma epopéia? Coisa que não deve ocorrer com muita frequência, certamente menos que a quantidade de romances escritos fortuitamente, aue por sua vez são menos prováveis de aparecer que os contos, e estes que as poesias; e estas que os provérbios. Quanto menos obras-primas surgidas a cada bilhão de macaquinhos hiperativos em atividade ininterrupta, mais valor tem o tipo de arte em questão, pois é mais determinada pela racionalidade do artista, e menos pela natureza animalesca dos macacos. Portanto a epopéia é o mais nobre de todos os gêneros literários, e os provérbios e as poesias concretistas de poucas letras, os mais rasos.

As artes plásticas podem ser nobres ou não, dependendo de que estilo estamos falando. Para um macaco parece até bem simples pintar um quadro abstrato, mas um afresco renascentista, esse vai precisar de alguns milênios pra sair. Esculturas também não são tão difíceis, imagine macacos mordendo eternamente blocos de mármore; até a natureza às vezes lapida formas familiares em rochas calcáreas. E cinema é ainda mais fácil, milhões de saguis com uma camera amarrada nas costas capturando imagens aleatórias; depois alguns outros numa ilha de edição fazendo montagens a esmo, e pode surgir um novo Scorcese.

Na França, a maioria das pessoas já conhece a teoria dos macaquinhos, e por isso estão cada vez mais céticas com a lei que vigora aqui estabelecendo gratuidade nos museus para estudantes de arte. Nas bilheterias eles deixam passar sem grandes problemas todos os artistas acima referidos, até os fazedores de provérbio. Mas para futuros designer a coisa começa a engrossar. Uma vez disseram pro Alexandre, tá achando que é artista só por causa desse rabinho de cavalo, monsieur? Design o meu macaco também faz.

E convenhamos que, para um macaco, escolher sem auerer uma garaldina para o texto corrido numa proporção de três pra quatro com a entrelinha e a mancha de menos de 72 caracteres não é tarefa de outro mundo. Mas a maioria das vezes os caixas deixam a gente passar. Implicancia mesmo é com a classe musical. Um macaco passeando agitado num piano escreve por dia duas sinfonias dodecafonicas. Um aue fique sossegado catando piolho o dia inteiro compõe quatro canções pop. Atropelando a lei, como costumam fazer com as que não lhe agradam, os parisienses impedem terminantemente os estudantes de música de entrar no Pompidou sem pagar.

Mas experimente falar que é cartunista. Até hoje nenhum macaco jamais conseguiu fazer uma história em quadrinhos completa, um ou outro já até terminou a primeira página, mas ao final nunca ninguém chegou. Por isso os franceses dedicam enormes sessões de suas livrarias às "bande dessinées" que não sobram no meio dos livros infantis, são considerados literatura adulta, produzidas por autores que gozqm de imenso prestígio nacionalmente. Quadrinhos na França é coisa séria.

Para um macaquinho é praticamente impossível fazer uma bande dessinée. Não é só a improvável missão de desenhar uma imagem inteligível ao lado de outra, é preciso reuni-las em torno de uma história que lhes dê sentido. Muitas diferentes técnicas de estimular o acaso têm sido tentadas, como oferecer bananas de recompensa ou grudar a caneta nanquim na mão dos macacos. Uma delas vem até sendo considerada trapaça pelos peritos; consiste em isolar imagens unitárias inteligíveis produzidas pelos macacos e misturá-las para que outros macacos as coloquem numa ordem aleatória. Mas nem assim conseguem se equiparar ao trabalho de um cartunista legítimo.

Aliás, saíram na França dois Astérix novos, que eu ainda não tinha visto em lugar nenhum. Um eu já comprei.

sábado, outubro 08, 2005

O centro do universo

O centro de uma esfera, li num livro de geometria, corresponde ao ponto cuja distância para a superfície é sempre a mesma. Por isso, não há muito o que discutir quando apontam o centro da Terra como o núcleo. Ou mais especificamente, aquele pentelhésimo bem ali no meio para o qual não faz diferença se o mundo gira, porque ele continua sempre no mesmo lugar.

Da mesma forma, o centro do sistema solar é o ponto em volta do qual tonteiam os planetas em suas órbitas elípticas, e que também coincide com o centro do Sol. Mas o Sol também se move, faz parte de um sistema ainda maior que roda sob a égide de uma estrela gigante, seu centro. E tudo isso vaga matematicamente dentro da Via Láctea, cuja meiuca está em algum lugar do encontro dos seus braços espiralados. Difícil de determinar exatamente, mas um dia a gente chega lá.

Complicado mesmo é achar o centro do universo. Como precisá-lo num espaço sem fronteiras, que mal se sabe se está crescendo ou encolhendo, ou se está na verdade parado e o que os pesquisadores identificam como expansão ou contração é apenas o pulmão dele bufando de cansaço depois do esforço do big bang? Só pela geometria não dá. Aí é que as ciências exatas dão lugar ao bom senso, elegendo por unanimidade Paris, a cidade para onde tudo converge e onde todos queriam estar, na qual tudo que se cria vira padrão de qualidade e é copiado por toda parte. Justa escolha para o centro do universo.

Mas calma. Não acabei ainda com os aumentos de escala. Paris é o centro do universo, mas maior do que o universo são as inúmeras hipóteses erradas em relação a ele. Posso chutar agora que lá no seu final há uma mesa de refeições onde Deus, Jesus e Virgem Maria jantam muito elegantemente a pomba do Espírito Santo assada com uma maçã da perdição na boca. Essa hipótese absurda não procede, mas a partir do momento que foi formulada tem que pertencer a algum conjunto, que não é o universo, é o conjunto do tudo. Que abarca também a cúpula negra onde estão coladas as estrelas, o mundo chato que deságua numa cachoeira, tudo o que não existe no universo mas alguém um dia pensou, tudo que no futuro não vai acontecer mas alguém acha que vai, e cujo centro naturalmente é o umbigo de cada um, no caso desse blog, o meu.

Não quero sugerir que o aumento de escala corresponde também a um aumento de importância. Embora o meu umbigo seja provavelmente mais importante que o pentelhésimo no núcleo da Terra, ele nem sonha em se equiparar a Paris, e por isso treme de ansiedade agora que os centros dos dois maiores conjuntos, o universo e o tudo, vão se encontrar. Ele espera que o centro do universo o receba sem ressalvas, mas apesar de ter sido educado de acordo com regras de comportamento ocidentalmente aceitas, sabe que não tem sofisticação suficiente para os padrões parisienses.

O francês escorreu pelo ralo, blindado está só no diploma da Aliança Francesa de oito anos atrás. O refinamento para a haute-couture, para a nouvelle cuisine, o savoir-faire, esses nunca vieram à tona. A fachada blasé vai quebrar em caquinhos à primeira vista da Notre Dame. A finesse, meu amigo, essa nunca decorou se a ordem dos talheres é de fora pra dentro ou de dentro pra fora, vai só rezar pra que o número de garfos e facas seja ímpar, que ao menos no do meio eu acerto. Também não sabe como quebrar escargot e espetar a lesma, se deve reclamar se alguma coisa no prato se mexer, se o pão se carrega no sovaco esquerdo ou direito. Mas vai assim mesmo, intimidado e inseguro que seja.

O encontro dos dois centros vai durar uma semana. Meu umbigo espera que não cause problemas para o horóscopo de ninguém nem dê nenhum rebuliço em nenhum campo gravitacional. Já Paris não está nem ligando.

quarta-feira, outubro 05, 2005

Ostalgie

É como foi batizada na Alemanha a onda recente de saudosismo do Leste – e Leste, em bom alemão, significa DDR, a república socialista de antes da queda do muro. Catapultada e disseminada mundo afora pelo Adeus, Lenin, aquele filme em que um filho tenta simular a antiga Alemanha Oriental para a mãe comuna que acordou do coma de quinze anos, a Ostalgie é a princípio inofensiva. Trata de exaltar a inocência nas embalagens dos artigos de supermercado no Leste, que travavam com o consumidor um diálogo bem diferente da cartilha selvagem do capitalismo. Trata de se afeiçoar aos pequenos ícones do lado direito do muro, como os bonitinhos bonecos do sinal de pedestre com seus chapéus cocos, reservando-lhes o carinho de uma criança crescida pelo teddybear surrado.

Mas a Ostalgie começa a ficar perigosa quando produz filmes como Sonnenallee e NFA. O primeiro faz graça da vida miserável de uma adolescente no governo oriental, e o segundo transforma em patetas os oficiais do exército comunista. Aí o bicho pega. Porque caricaturar realidades que nada têm de divertidas, fazendo do regime ditatorial motivo de riso, camuflam sua perversidade e induzem o povo a perdoar o passado negro de seu país.

Isso é o que diz minha professora de alemão, com quem tive sobre o tema uma discussão claudicante. Claudicante da minha parte, errando todas as declinações. Ela tinha a vantagem de ser fluente na língua.

Então rebato agora, na língua em que o fluente sou eu, que virar piada é o último passo para um tabu cair do pedestal, ser chutado no meio-fio das calçadas movimentadas e ficar desimportante o suficiente para impossibilitar seu retorno. Tanto melhor então que os alemães estão, com a Ostalgie, aprendendo a rir de seus traumas, pois só assim eles desaparecem.

Mas você nem viu nenhum dos filmes, a professora retruca, como pode ficar teorizando em cima?

Ver, você não viu também não, espertona.

Só que as estatísticas estão aí mostrando que 25% dos berlinenses ocidentais e 18% dos orientais estariam era bem satisfeitos se tivesse um murozinho cortando a cidade no meio. Não parece motivo suficiente para ficar com um pé atrás?

Certamente é só da boca pra fora. A Sonnenallee do filme, que já foi comunista um dia, hoje abriga um complexo de entretenimento com um show permanente de imitadores de Elvis, Blues Brothers, Michael Jackson e outros menos cotados. Terreno mais seguro não há para fazer piada com o socialismo.

E no entanto os brasileiros, tão famosos por rirem de suas desgraças, até hoje não conseguiram resolver seus problemas.

Ainda que com todos os problemas que temos, sejamos mais felizes que os alemães.

Tenho um amigo que diz que se tivesse que representar o espírito do Brasil num pequeno desenho, faria uma poça de areia movediça terminando de engolir uma mão com um polegar pra cima em sinal de positivo.

E eu representaria o pensamento alemão com um campo florido lindíssimo e um babaca mandando ver no cortador de grama.

Cortador de grama é o que passaram no seu cérebro.

Areia movediça é onde afunda a sua inteligência.

E aí não teve jeito, a discussão descambou para a violência.

domingo, outubro 02, 2005

Fronteiras, estatísticas idiotas, tragédia argentina

- O país que faz fronteiras com a maior quantidade de outros países é a China, que tem catorze vizinhos.

- O Brasil, se procura algo para se orgulhar nos intervalos entre as copas, pode exibir nesse ínterim a medalha de bronze. Temos dez fronteiras diferentes, atrás também da Rússia, que tem doze.

- A Rússia, no entanto, fica em primeiro no quesito extensão de fronteiras: são pra lá de vinte mil quilômetros compartilhados com outros países.

- Na Europa, por sua vez, a nação que mais tem vizinhos é a Alemanha, com nove, quarta colocada no total geral.

- A maior fronteira do mundo está entre o Canadá e os Estados Unidos. Outras de tamanho considerável dividem a Argentina do Chile, e a Rússia do Casaquistão.

- O país com menor proporção entre o número de vizinhos e a área territorial é a Austrália, que para seus 6,7 milhões de quilômetros quadrados não tem fronteira nenhuma.

- Já a Áustria, que em menos de cem mil quilômetros quadrados possui oito vizinhos, tem, senão a maior (pois as naçõezetas do tamanho de uma cidade a ultrapassariam), ao menos a mais impressionante proporção entre fronteiras e área territorial.

- O rio cujo curso é mais utilizado para delimitação de fronteiras é o Ubangi, que corre entre o antigo Zaire e seus vizinhos ocidentais para desaguar no Atlântico.

- E o Danúbio, na Europa, é o que delimita fronteiras entre mais países diferentes, passando na borda da Áustria, Eslováquia, Hungria, Croácia, Sérvia, Romênia, Bulgária e Ucrânia (a Hungria, aliás, é o único país do Leste Europeu que não tem o nome escrito com acento).

- Somando todo o precioso tempo que eu passei preso nas fronteiras européias para controle de passaporte, dava pra ir e voltar pra Moscou no lombo de um jumento.

- Se juntássemos todas as estatísticas comparativas idiotas já inventadas, como essa e a anterior, poderiam ser preenchidos volumes equivalentes a 437 milhões de Bíblias.

- Empilhando todas essas Bíblias seria possível contruir um sólido muro de 15 metros de altura passando por toda a extensão de fronteiras de um país como, digamos, a Argentina.

- Depois é só encher de água.

- Se toda a água usada para afogar a Argentina fosse engarrafada em recipientes de um litro, o número de garrafas poderia matar a sede de toda a população terrestre por sete anos.

- Se toda a população da Terra bebesse essa água de uma vez só, o aumento na produção de urina seria de mais de quinze mil por cento.

- Depois é só pegar o excedente e tacar de novo na Argentina recém-esvaziada, pra ver se eles aprendem.

- Se todos os argentinos vítimas das inundações de água e mijo fossem fatiados em filés tenros e servidos de comer aos necessitados, a população não teria fome por oito anos.

- Bem alimentada e hidratada, a população humana agora também sem conflitos religiosos (todos se converteram ao islamismo, pois as religiões cristã e judaica perderam a força quando as páginas das Bíblias do mundo se desmancharam nas duas inundações), e além disso consternada e solidarizada após a tragédia que se abateu sobre a Argentina, adotaria o Esperanto e se uniria finalmente sob uma só bandeira, ignorando as diferenças de raça, classe e ideologia, e abolindo de vez essas malditas fronteiras que tanto tempo me tomam.

Profile

Rodrigo Rego

Sou designer, fascinado por bandeiras, jogos de tabuleiro, países distantes, e uma miscelânea de assuntos destilados quase semanalmente neste espaço.

Visite meu site, batizado em votação feita aqui mesmo, Hungry Mind.

rodrego(arroba)gmail.com
+55 21 91102610
Rio de Janeiro

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