terça-feira, setembro 30, 2008

Por que é melhor ficar no Rio

Amanhã completam-se 4 semanas que a Paula foi pra França, e ainda me restam outras 36 antes de ela voltar. Meu plano original era ir junto, mas como não consegui, tenho que passar esse tempo de outra forma.

Um carioca comum na mesma situação teria toda razão em se lamentar. Mas há excelentes motivos para se ficar no Rio chupando o dedo em lugar de comer pão ensovacado em Paris. A mente fraca até sabe quais, se lembra de um aqui, esquece de outro logo mais, e por falta de organização não se agarra a nenhum deles e acaba afundando na saudade.

A mente forte faz uma lista de ótimas razões para continuar no Rio e prega na tela do computador que é pra lembrar delas sempre.

Razões indiscutíveis para se ficar no Rio

1. Descobrir o futuro do Trocadero Othon
Tem um hotel na esquina da minha rua com a praia que está em reforma há três anos, sem dar pista do que possa virar. Uma capa preta cobre a fachada como se fosse um truque de desaparecimento mágico demorado, a qualquer momento cai o pano e o que será que aparece no lugar? Um não-hotel, assim espero, algo que valha a expectativa. Uma usina nuclear, um obelisco, uma obra póstuma gigante do Amílcar de Castro. Meu chute: um parquinho.

2. Turismo intramunicipal
Você pode dizer que conhece Paris, mas duvido que tenha a petulância de dzer que conhece o Rio. As pessoas sequer conhecem seu próprio bairro. Copacabana, cada vez que eu acho que completei, surge mais uma rua pra explorar. Sete anos atrás, descobri que havia um morro entre a Barata Ribeiro e a Nossa Senhora, perto do metrô. Anos depois, achei outro logo em frente, entre a Nossa Senhora e a praia.

Quero cumprir a antiga promessa de entrar no Jardim Pernambuco. Quero depois subir uma dessas ladeiras de São Conrado que não vão dar nem na favela nem no Itanhangá. E mais: chegar em Santa Teresa pela Lapa e sair pelo Cosme Velho e andar pela rua que liga o Jardim Botânico a Botafogo por cima do Rebouças, pra começar.

3. Horário político
Muita gente diz que gosta de horário político pra ver o show de horrores dos candidatos a vereador, mas a mim aquilo só me deprime. Gosto de ver as campanhas dos prefeitos. Não sou militante nem nada, mas adoro me deixar enganar pelas propostas milaborantes para a cidade. Se toda obra fosse tão barata quanto a maquete, o Rio hoje teria no mínimo um monorail e um aquário público.

4. Civilization III
Redescobri e tenho jogado tresloucadamente. Nada melhor para curar a solidão que embolar um monte de soldadinhos numa guerra de civilizações. Claro que poderia fazer isso em Paris também, mas a consciência ia pesar muito mais.

sábado, setembro 20, 2008

Pequeno conto macabro

Antero e Antônio, velhos amigos, caminhando pela Lapa às três da manhã. Pára um menino de rua, oito anos, na frente deles.

— No 26 de janeiro de 2059, o senhor vai morrer.
— Sai pra lá moleque! — diz Antônio.

— O senhor vai morrer amanhã.
— Se escafede, pivete! — diz Antero.

No dia seguinte, Antero tem um mal súbito e falece. Antônio passou o resto dos seus dias aterrorizado, em contagem regressiva.

sábado, setembro 06, 2008

Química básica inventada, 3a edição

Hoje fui à Esdi assistir uma palestra pra despertar a mufa do tenebroso inverno. Eu que já fui palestra buff, hoje ando exercitando os miolos só com filmes do Estação e palavras cruzadas, quase um aposentado evitando a esclerose. Estava mais que na hora de fazer eles voltarem a estalar.

A palestra era sobre obra aberta, aquela em que o autor abdica dos seus direitos pra vê-la circulando por aí sendo usada e modificada pelo público. É um assunto que interessa tanto meu lado designer quanto meu lado um-dia-ainda-vou-ser-rico-e-famoso-escrevendo-um-livro. Mas não rendeu muito: dois minutos depois do início, os palestrantes concordaram que obra aberta era terrível e foram falar de outros assuntos.

Mas como os dois eram muito bons, acabou rendendo um bocado.

O melhor momento foi a inversão de papéis entre livros de ficção e livros técnicos.

Segundo eles, as histórias ficcionais são as únicas em que se pode ter certeza absoluta do fato ali contado. Portanto, é mais verdadeira que a realidade. Já os livros técnicos, de física, medicina, direito, são muito mais ficcionais. Todos eles se baseiam no método científico, que por mais infalível que seja, é como um jogo. E como todo jogo, só faz sentido dentro do universo particular das suas próprias regras. Ficção pura.

Depois de ouvir toda essa retórica, comecei a pensar em como seria um livro técnico ficcional – literalmente. Digamos, um livro de química cheio de equações inventadas, por exemplo.

Falo em química porque, por estudar objetos microscópicos, nos obriga a aceitar o que os livros dizem, sem comprovação possível. E se os livros de químida na verdade forem todos bem elaboradas obras de ficção? E se o trabalho do romancista fosse inventar uma lógica diferente para os fenômenos químicos?

Seria um livro igual a qualquer outro de segundo grau, sem concessões. Apenas conceitos e fórmulas que explicam de forma plausível as reações, mas tudo inventado.

Nem é novidade a idéia. Não existem dicionários élficos? Ou então: leiam Duna para ver que o autor criou o ecossistema de um planeta inteiro para servir de pano de fundo pra sua história.

Melhor ainda: alguém já foi à Molvânia? Claro que não, ela não existe. Mas tem, sim, um guia turístico, feito pra gente acreditar que ela está lá perdida em algum lugar às margens da União Soviética.

Profile

Rodrigo Rego

Sou designer, fascinado por bandeiras, jogos de tabuleiro, países distantes, e uma miscelânea de assuntos destilados quase semanalmente neste espaço.

Visite meu site, batizado em votação feita aqui mesmo, Hungry Mind.

rodrego(arroba)gmail.com
+55 21 91102610
Rio de Janeiro

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